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terça-feira, 13 de novembro de 2012

AMADORES

Por: João Paulo da Silva
 
 
 
Aconteceu um dia desses em Mossoró, no interior do Rio Grande do Norte. Eu tinha viajado a trabalho, como de costume. Talvez você não saiba, mas sou jornalista, embora isso não queira dizer muita coisa. Bom, era noite. E eu tinha acabado de fechar algumas matérias para o jornal. Estava cansado. Precisava relaxar. Foi aí que resolvi dar um pulo no bar da esquina pra tomar uma cerveja e arejar um pouco as ideias. Mas não pretendia demorar muito. Afinal, queria voltar a tempo para ver a minha novela das nove. Por isso, pedi apenas uma gelada e um pequeno aperitivo. Iscas de peixe. Adoro iscas de peixe, ainda mais com um limãozinho por cima. Enfim, eu estava querendo aliviar as tensões. Ficar tranquilo. Nada de estresse. Mas a vida é dura e às vezes o pastel vem estragado.
 
Na mesa da frente, havia um sujeito esquisito. Magro, alto, cabeçudo. Feio pra cacete. Fumava um cigarro atrás do outro. De vez em quando me olhava, como se quisesse puxar conversa. Eu fingia que não via. Queria silêncio, paz, cerveja e iscas de peixe. Nada de papo. Queria ficar na minha. Na hora, pensei: hoje dou conversa apenas pra Scarlett Johansson, e ainda assim só se ela pagar a conta. Eu estava cansado. Mas o magricela começou a olhar insistentemente, como quem está prestes a falar alguma coisa. Primeiro perguntou se a fumaça do cigarro dele atrapalhava. Respondi que não. Na verdade, nem falei. Só balancei a cabeça, pra não encorajar o cara. Não teve jeito. Depois, quando me dei conta, o chato já falava pelos cotovelos. O tempo, o calor, as nuvens. Começa assim. Puta merda!
 
- Não me leve a mal, mas no quê o senhor trabalha?
 – perguntou ele. - Sou jornalista.
– pensei em dizer que era pistoleiro.
- Hum... Interessante. Então você deve lidar com muitas informações.
- Algumas.
- Deve ser um homem que sabe de muita coisa.
- O suficiente.
– tentei usar respostas monossilábicas, na esperança de que ele desistisse de falar.
- Bom, eu também trabalho com informações. Informações que talvez possam lhe interessar.
- E o quê poderia me interessar?
- Tenho vídeos e documentos secretos. Coisa quente. De gente importante. Comprometedores.
- É mesmo? De quem, por exemplo?
- Guardo comigo segredos graúdos de ministros do STF. - Sei... do Supremo?
 – o cara era maluco. Com aquele papo de doido, só podia ser.
- Sim. Do Supremo. Sei muita coisa também envolvendo o alto escalão do governo. Informações que podem derrubar muita gente e abalar o regime.
- Entendo. E por que resolveu contar isso logo pra mim?
– resolvi entrar no jogo do magricela.
- Fui com a sua cara. Essas informações poderiam ser úteis pra você, já que é jornalista.
- E do que se trata?
– só podia ser brincadeira. Acabei dando corda.
- Não posso dizer aqui. Temos que marcar um encontro, em outro lugar. Aí lhe passo o material.
- Sei...
– desconfiei que o sujeito quisesse me comer. Ou, no mínimo, me roubar.
- Posso anotar seu telefone e email?
– insistiu o cabeçudo. - Claro.
– ditei número e endereço falsos. Tenho apenas a cara de besta.
- É coisa pesada. Garanto.
- Imagino. Como consegue as informações?
- Tenho meus contatos. Pessoas certas, nas horas e locais certos.
- Muitas informações podem fazer de você um homem perigoso.
 – insinuei. Já me divertindo com o maluco.
- Perigoso para quem?
- Depende das circunstâncias. Mas você é quem deve saber. Lembre-se que coisas desse tipo também fazem de você um alvo.
– falei sério, com o rosto fechado, embora estivesse explodindo em gargalhadas por dentro.
- Isso é um aviso pra mim?!
– ele se assustou.
- Não, não, não. Fique tranquilo. Eu não mando avisos. Eu sou o aviso.
– dei uma de James Bond. - Você é esperto, mais do que eu imaginei.
– o magricela sorriu. Faltavam-lhe três dentes, pelo menos.
- Não tanto quanto você, eu suponho.
- Olha, quer saber a verdade?
- Sempre.
- Trabalhei para o Mossad por três anos. Você sabe o que é o Mossad, não sabe?
– foi a gota d’água. Definitivamente, o cara era maluco. De todo modo, pus a mão na faca em cima da mesa e pedi a conta.
- Claro que sei. Mas, se me permite, posso lhe fazer uma última pergunta?
- Sim. À vontade.
- Conhece aquele ditado popular que diz: “o peixe morre pela boca”?
- Isso agora é uma ameaça pra mim, não é?
– ele esbugalhou os olhos, assustado novamente. Enquanto respondia a pergunta, fui levantando lentamente da cadeira.
- Você não deveria falar demais, muito menos para alguém que nem conhece direito. Mas fique tranquilo. Você não vai morrer hoje. Não pelas minhas mãos. Até outro dia. – toquei o ombro dele e sai do bar, com um sorriso no canto da boca. Um espião do serviço secreto israelense em Mossoró?! E ainda por cima banguela?! Francamente. Amadores... essa gente não se emenda.

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